Conto - Halloween.

Halloween - Prisioneiro da Eternidade

Já há algum tempo Cintia esperava por aquela oportunidade: estar sozinha em casa para poder fazer uso da tão famosa Tábua de Ouija que havia comprado em um antiquário do centro da cidade. Mas ela não acreditava que a oportunidade se daria em uma data tão “propícia”: 31 de outubro, o famoso Dia das Bruxas.
Muito já tinha ouvido falar sobre o perigo de se brincar com as forças espirituais, mas a garota se julgava experiente em tais assuntos por causa da religião pagã que seguia e dos estudos relacionados ao tema ao qual se dedicava já há bastante tempo.
Convenceu três amigos para participarem do evento: Michele e Érica (também seguidoras da mesma religião que ela) e Heitor (que aceitou o convite após muita insistência da amiga). Jovens, curiosos e que acreditavam conhecer todos os mistérios da vida e além dela.

Por volta das vinte horas todos já estavam reunidos na casa de Cintia, iluminada somente por inúmeras velas coloridas e que, com a ajuda do mobiliário antigo da sala, conferiam ao local uma atmosfera sinistra.

Ao entrar, Heitor quase desistiu e saiu correndo, mas as garotas souberam convencê-lo.

- Ora Heitor, quantos amigos seus em uma noite como essa estão acompanhados por três gatas como nós? Você deveria estar feliz com a oportunidade. – disse Érica.
- Mas isso aqui tá sinistro demais, não curto essas paradas não, pode dar merda.
- Não se preocupe Heitor, sabemos o que estamos fazendo, fique calmo. – prosseguiu Cintia.
- Além do mais, se tudo sair como planejamos, haverá uma comemoração quando tudo acabar, e aposto que você vai gostar bastante. – disse, maliciosamente, Michele.
Um sorriso sacana surgiu na face do rapaz.
- Essas abóboras, elas sempre me encheram de medo. – disse Heitor apontando para a decorativa abóbora comum ao Dia das Bruxas sobre um dos cômodos próximos.
- Relaxa, elas são inofensivas. – disse Cibele rindo.
Finalmente eles decidiram, então, iniciar as atividades.
Tábua Ouija sobre a mesa e todos devidamente posicionados ao redor dela. Começou a sessão de comunicação com o plano espiritual.
Permaneceram concentrados por vários minutos até que a anfitriã iniciou os questionamentos de praxe.
O silêncio absoluto quase permitia que se ouvissem os batimentos acelerados do coração do rapaz, quer fosse pelo medo que se esforçava por dominar, quer fosse pela expectativa que nutria acerca da prometida “comemoração”.
Inúmeras tentativas de contato, mas a tábua estava inerte. Prosseguiram com a concentração por mais alguns minutos, mas as garotas começaram a se aborrecer com a ausência de resultados.
- É só isso? – indagou Heitor em tom sarcástico.
- Parece que não tá dando certo, droga. – praguejou Cintia.
- Não entendo o que pode estar acontecendo, essa é uma tábua original e somos iniciadas nas artes do ocultismo... – prosseguiu Michele.
- Deve ser esse cara que tá atrapalhando, desde que sentamos aqui o volume nas calças dele não desaparece. Imbecil. – ralhou Érica.
- Epa, calma aí. Eu não tenho culpa de nada. Estou fazendo o que me disseram pra fazer. Não tenho culpa se não tá dando certo.
- Mas não está concentrado na tábua, deve tá concentrado em outra coisa... – continuou Érica.
- Silêncio. Ainda que ele não esteja tão concentrado na comunicação, nós estamos, e isso já deveria ser o suficiente. Alguma coisa tá errada mesmo. – concluiu Michele.
A essa altura nenhum deles mais dispunha as mãos sobre a tábua e o desânimo era geral, até mesmo para Heitor, que embora aliviado por não ter presenciado nenhuma manifestação, via a perspectiva de transar com alguma das belas garotas ir embora.
Cintia se levantou e foi até a janela, assustando-se com um relâmpago inesperado que iluminou todo o cômodo.
- Nossa, vai chover? – indagou Érica.
- É, tá vindo uma tempestade. Pior que o tempo estava ótimo, céu estrelado... Coisa esquisita.
- Deve ser essas coisas que vocês ficam fazendo, deve ter atraído alguma coisa, sei lá. Eu disse que não ia dar certo.
- Cala a boca garoto, uma coisa não tem nada a ver com a outra. E deve ter sido por esse seu desejo em nada dar certo que realmente não deu, seu idiota.
- Calma Érica, o garoto não tem culpa. E fui eu quem prometi alguma coisa pra ele, você não tem nada com isso.
- Obrigado Michele, bom, chegou a hora da comemoração?
Érica quase avançou sobre ele.
- Ofélia viajou também, se quiserem podem ir para o quarto dela, mas não façam muita bagunça por lá. – disse Cintia.
Michele agarrou Heitor pela mão e eles seguiram para o quarto da empregada.
- Você não devia ter chamado ele aqui. Esse cara estragou tudo, aposto que foi por causa dele que as coisas não deram certo. Não sei por que você chamou ele.
- Pára com isso Érica, conhecemos ele já há bastante tempo. Quem mais a gente poderia chamar? Essa sua implicância com os homens... Tudo bem que eles são movidos pelos hormônios, mas eu gosto de homens. Além do mais, a Michele sempre teve uma quedinha pelo Heitor.
- Pois é, cada um tem um gosto. Mas e agora, o que ficaremos fazendo?
- Nem olha pra mim desse jeito, você sabe que meu negócio é outro Érica.
- Ok, tudo bem. Mas vamos dar uma olhada em umas coisas que eu imprimi. Peguei na internet esses dias, tem umas coisas bem interessantes.
- Ah, essas coisas de internet não tem nada a ver, só tem besteira.
- Foi difícil, mas eu achei um site alemão que tem umas coisas legais. Vem aqui dar uma olhada. – insistiu a garota abrindo a mochila e retirando uns papéis.
- Só que eu não falo alemão.
- Mas eu falo, e traduzi pra gente, vem aqui ver.
Enquanto elas liam o material trazido a tempestade finalmente desabou sobre o bairro. Relâmpagos clareavam a penumbra em que se encontravam e os poderosos trovões as faziam saltar no sofá cada vez que eles faziam tremer a residência.
Após quase uma hora Heitor finalmente saiu do quarto com passos apressados.
- Se divertiu? – indagou Érica, com nojo.
- Cadê a Michele? – prosseguiu Cintia notando um ar de pavor no rosto do rapaz.
- Ela, ela está se vestindo. – ele respondeu apressadamente enquanto ia até a porta.
- Aonde você vai cara? Não tá vendo a baita chuva que tá caindo?
- Cala a boca Érica, você não sabe de nada sua infeliz!
Antes mesmo que a garota se levantasse do sofá e avançasse sobre ele a porta da sala foi aberta.
Mas o forte vento que invadiu o local não causou espanto às duas garotas, mas sim o enorme vulto que por ela adentrou.
- Conforme prometido, são todas suas. Espero que cumpra com seu papel em nosso trato, Friedrich.
- Por certo cumprirei, agora vá, daqui para frente eu assumo. Muito obrigado por sua ajuda. – o pesado sotaque alemão denunciava a procedência do enorme homem que, devido à sua altura, quase não passava pela porta, vestindo um negro sobretudo.
Sem mais nada dizer o rapaz saiu correndo debaixo da torrencial chuva.
Cibele foi de encontro ao intruso e tentou empurrá-lo para fora, mas caiu no chão após receber um potente tapa no rosto.
- Tábua Ouija... Deveriam deixar essas coisas para quem entende disso. – murmurou o homem cujos olhos eram vermelhos como brasas.
- Miserável, o que você quer da gente? – gritou Érica quase em lágrimas.
- Na verdade não sou eu, mas sim, meu Mestre. Logo entenderão.
A outra garota, percebendo que tentar lutar seria inútil, correu para o quarto onde estava Michele e se horrorizou ao encontrá-la nua e ensangüentada, amarrada, amordaçada sobre a cama e com um enorme pentagrama desenhado na barriga.
- Pela Deusa, o que é isso? – ela gritou horrorizada.
Após trancar a porta tentou, em vão, soltar as amarras da amiga, mas sua atenção se voltou à porta quando ela foi arrombada com um forte chute dado por Friedrich, que arrastava Cibele pelos cabelos.
O diabólico sorriso que ele estampava denunciava suas intenções.
- Está na hora de começar... – ele finalizou finalmente enquanto retirava um punhal da cintura.

...

Após uma semana Sr. e Sra. Pereira retornaram de viagem e, horrorizados, encontraram os corpos das garotas na sala, pendurados pelos pés, sacrificadas em um ritual satânico.
Heitor, que se enforcara alguns dias após a surpreendente tempestade que assolara a cidade, já havia sido enterrado.
Friedrich, não mais foi visto.


2 comentários:

  1. Aeee.. Conto de Helloween, bom hein cara!!

    Abraço

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  2. sombrio e capaz de prender o leitor ate o final.

    http://terza-rima.blogspot.com/

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